25 de Setembro



Eu estava fechado para o amor. Mas ele não respeita travas, fechaduras ou portas, não, ele não se importa. O amor é invasão de domicílio. É apropriamento indevido. Da janela de mim eu via pessoas passarem apressadas. Pessoas de passos largos e corações apertados. Do escuro quarto da minha alma eu via terceiros passarem em segundos. Já estive lá fora também, mas primei pelo erro. Mas isso fora antes. Agora eu era prisioneiro de mim mesmo. Das janelas eu também via a chuva cair sem forças pra me levantar. Não podia ouvi-la, toca-la, senti-la. Ela lá, eu dó. Melodias e melodramas tocados em diferentes notas musicais. Eu, à deriva de mim, barco sem cais. Chovia naquela tarde de quarta-feira, 25 de Setembro. Sim, da chuva eu me lembro. Mas confesso não saber dizer ao certo como tudo aconteceu. Pela janela do quarto eu vi um clarão, o céu chorava e gritava “TROVÃO!”. O céu, então, no chão uma menina derramou. Não sei o porquê, nem por quais razões, mas com um único olhar aquela menina me desarmou. Fechei as cortinas dos olhos com medo dos efeitos colaterais da tempestade que se iniciara lá fora e transcendera pra dentro de mim. Corri tremendo, mas pequeno, e de nada adiantou me esconder debaixo da cama. E hoje eu sei que só se deve amar a quem realmente ama.

Há Temporal e Chuva Por Você Aqui



Te amo aqui,
Te amo agora.
Te amei antes
E amarei após todas as horas.
Por ti meu amor é atemporal.
Te amo forte e sereno.

Te amo chuva e temporal.

O Amor Muda.



O amor muda, semente,
Que, se plantada, regada, cuidada,
Cresce, eterno, imenso.
Alcançando o berço do infinito.

Adoro quando você me fala palavras mudas.
E do silêncio das mudas nascem estas flores,
Nuas, suas, minhas, nossas, sem pudores,
Não precisamos dizer nada para que tudo seja dito.

O amor muda, cala, silencia...
Toda forma de dor que grita em solidão.
Só não vê beleza no mundo
Quem borra os olhos com lágrimas.

Então derrama teu corpo no meu.
Derrama-te em mim como a chuva,
Pois se derramar é, também, amar.
A roupa do corpo é a pele do outro.

10 de Janeiro de 2014



Hoje tinha tudo pra ser mais um daqueles dias tais. Mas a vida deve ser lida como um livro novo, recém-publicado, página por página, aproveitando os mais pequenos detalhes. O cheiro de novo, de novo. Todos os dias. Sim, a vida deve ser linda. Nos títulos, nos parágrafos, nas notas de rodapé. Eu percebi que havia algo de muito certo no dia de hoje quando, do nada, ela não chegou atrasada. Pelo contrário, ela chegou adiantada, bem antes do horário. A gente tinha planejado assistir um filme qualquer, de uma sessão qualquer, mas acabamos protagonizando nosso próprio curta-metragem. E teve de tudo um pouco. Eu via no olhar da minha pequena a angústia. Eu lia nos seus lábios o temor. Mas pra quê ter medo se temos amor? E logo tudo desabou em alívio. Como a chuva desabava lá fora. Claro, não poderia faltar chuva. E, enfim, depois de um D.P.*, nos entregamos ao presente. E ao choro do céu. Eu realmente não sabia onde a chuva acabava e ela começava, parecem ser uma coisa só. E eu ali, enlaçado nelas, em um engodo, um nó. Nas escadarias, então, fez-se ápice, clímax. Naquele instante ela me fez tocar o céu. Um beijo imenso, intenso, daqueles que a gente sempre lê e imagina ou assiste no cinema e acha ser “perfeito” demais pra caber nessa realidade. Mas coube. E transbordou. Nós dois, ali, presos ao momento. Protagonistas do instante. Ironicamente subindo as escadas pra chuva descer. Cair. Benzer. Eu tenho certeza absoluta do tempo ter dado a si mesmo um tempo naquela hora. Em alguns minutos... A eternidade.

Discutir o Passado*

"E naquele momento, eu juro, nós eramos infinitos".

Liliane



Ao léu e ao fel vivia o poeta morto, lastimando a cada letra de sua poesia decadente um lapso de memória, de lembrança vil, virulenta, que dilacerava como a mais afiada lâmina não só a carne, mas a mente, a alma e o espírito corrompido. Leal ao amor havia sido o poeta, mas o que dele havia obtido era o limite mais baixo da ingratidão. Lançou-se ao fundo do poço, ao buraco mais profundo, distante, localizado ao norte de nenhum lugar e leste de lugar nenhum. Logo o lençol de águas e lágrimas cobriu o poeta, afogando-o, mergulhando-o nos seus próprios demônios, anseios e pesadelos. Tão profundo e distante que seus lamentos já não se faziam mais ouvir. A bendita água amaldiçoava o homem que um dia atrevera-se a amar e sobre o amor escrever, terminando o trabalho que aquela falsa musa havia, antes mesmo do início, começado. Eis que de úmido escuro faz-se clarão, no alto do poço nasce uma estrela que, tal qual a mais ardente lanterna, vide a mim, guiar. Vi do fundo mais distante do mundo luzir o teu farol, para, enfim, de lá, a mim, tirar. Sim, sou o poeta. Sim, nadei. Mas não, no litoral não morrerei. Lentamente lapida-se a pedra lilás de lápis-lazúli na forma de minha mulher. Lírio do jardim, labirinto de minha alma. Perder-me em ti foi encontrar-me, enfim. Lento o vento leva e trás, lá e cá, loucuras em chuva, em mar e re-amar. A liberdade livra os loucos das lastimáveis correntes da falsidade, trazendo à tona a lasciva libertinagem outrora esquecida, guardada. No linho da roupa que se rasga, no laço desfeito com o passado, na libido a transbordar em lábios sedentos, na luz da Lua, nua, em litígio ao Sol que se opõe, se pondo, distante, longe, no horizonte, tal qual o pôr-do-homem em sua lápide, mortal e final. Fim de quem ama é, no fim, amar.